Reforma parcelar<br>insuficiente e capciosa
Baixaram à comissão as seis propostas do PCP destinadas a reconduzir ao seu espírito original o decreto-lei governamental sobre as chamadas unidades de saúde familiares (USF).
As USF são para o Governo uma espécie de canivete suíço
A matéria dominou a agenda plenária de sexta-feira passada em apreciação parlamentar ao diploma suscitada pelo PCP, que justificou a iniciativa por considerar que esta reforma peca por ser «parcelar, insuficiente e capciosa».
Foi com estas palavras que o líder parlamentar comunista definiu, em síntese, esta medida de política do Executivo – a criação das USF – e por este apresentada como a solução para todos os males. «No discurso político do Governo as USF são uma espécie de canivete suíço que resolve todos os problemas», frisou, lembrando, todavia, que é enorme a distância que vai da propaganda à realidade.
E sem deixar de reconhecer que os princípios e orientações subjacentes à medida até são positivos, sendo mesmo partilhados e há muito propostos pelo PCP, Bernardino Soares fez notar, contudo, que a filosofia de base é pervertida na prática pela actual política.
Desde logo, explicou, «pela falta de investimento e pela continuada carência de recursos humanos», mas também pela «aposta em criar unidades retirando recursos aos centros de saúde do modelo tradicional». Ora sem se garantir o preenchimento dessas brechas, como observou o presidente da formação comunista, acontece o mesmo que com um «cobertor curto: se tapamos a cabeça, destapamos os pés».
A mesma política
Com a nova titular da pasta da Saúde ausente, coube a Maria Antónia Almeida Santos em nome da maioria defender a política de saúde do Executivo. E interveio para recusar o epíteto de reforma «parcelar», dizendo preferir chamar-lhe «gradual». Afirmou-se também muito satisfeita por 152 mil utentes terem passado a dispor de médico de família.
O secretário de Estado da Saúde, Francisco Ramos, afinando pelo mesmo diapasão, depois de ter garantido que o Governo tem «a mesma política» e a «mesma prioridade política», considerou que a reforma dos cuidados primários de saúde é «prioritária» e será incrementada de forma «gradual, lenta e segura».
Na réplica, o presidente do Grupo comunista insistiu na ideia de que esta reforma é parcelar, assinalando, entre outras razões, o facto de em nenhum lado estar escrito que o objectivo é estender o sistema das USF a todo o País e a todos os portugueses. E lembrou, demonstrando como é parcelar, a circunstância de reduzir os cuidados primários de saúde a «uma multidisciplinaridade restrita, uma vez que só comporta clínicos gerais, enfermeiros e administrativos».
Privatização à vista
Pôs igualmente em evidência esse outro traço marcante da reforma que é o de ser «insuficiente», qualidade que lhe é conferida por não ter «os meios para resolver os graves problemas de falta de recursos humanos, de instalações desajustadas e decrépitas, da falta de equipamentos e outros meios».
Recordado, a este respeito, foi também o facto de os resultados da reforma estarem longe da propaganda inicial e dos objectivos anunciados pelo anterior ministro da Saúde que, em Agosto de 2006, chegou a afirmar que só nesse ano, com a entrada em vigor de 100 USF, mais de 160 mil pessoas teriam finalmente médico de família.
Outra questão central criticada na reforma – e por isso o líder comunista a apelidou de capciosa – prende-se com os propósitos nela não declarados. «Esconde a grave questão da privatização dos cuidados primários, que o Governo não inscreveu no decreto-lei, escondendo-a num despacho normativo», acusou Bernardino Soares, obtendo do secretário de Estado a resposta de que tudo não passa de um «preconceito ideológico» do PCP.
Ouvida no debate a posição sintonizada quer da maioria quer do Governo, o presidente da formação comunista viu confirmadas as razões de preocupação da sua bancada e não teve dúvidas em concluir que o Governo admite que «2008 seja o ano da entrada do capital privado nos cuidados primários de saúde».
Saúde como negócio
Na resposta às acusações de Bernardino Soares, a deputada Maria Antónia Almeida Santos (PS) evocou o facto de o diploma ter sido «alvo de negociação colectiva com os sindicatos», assegurando ainda que se baseia na «gestão participada e na auto-associação» dos profissionais. Disse registar, por outro lado, vendo nisso uma aparente contradição, o facto de o PCP estar de acordo com os princípios subjacentes ao diploma.
O líder parlamentar comunista refutou os argumentos lembrando-lhe que, sendo certo que o decreto-lei foi negociado com os sindicatos, não deixa de ser igualmente verdade que estes se queixam de que uma parte do acordado não está a ser pago. «Não basta negociar; é preciso depois cumprir o acordado com os sindicatos e não é isso que o Governo está a fazer», sustentou.
E sobre os princípios partilhados pelo PCP, Bernardino Soares não hesitou em reiterar a sua concordância com os mesmos. O problema não está aí mas sim na «prática do Governo e na possibilidade de privatização», explicou, fazendo notar que em relação a esta questão central a deputada do PS não disse rigorosamente nada.
Foi com estas palavras que o líder parlamentar comunista definiu, em síntese, esta medida de política do Executivo – a criação das USF – e por este apresentada como a solução para todos os males. «No discurso político do Governo as USF são uma espécie de canivete suíço que resolve todos os problemas», frisou, lembrando, todavia, que é enorme a distância que vai da propaganda à realidade.
E sem deixar de reconhecer que os princípios e orientações subjacentes à medida até são positivos, sendo mesmo partilhados e há muito propostos pelo PCP, Bernardino Soares fez notar, contudo, que a filosofia de base é pervertida na prática pela actual política.
Desde logo, explicou, «pela falta de investimento e pela continuada carência de recursos humanos», mas também pela «aposta em criar unidades retirando recursos aos centros de saúde do modelo tradicional». Ora sem se garantir o preenchimento dessas brechas, como observou o presidente da formação comunista, acontece o mesmo que com um «cobertor curto: se tapamos a cabeça, destapamos os pés».
A mesma política
Com a nova titular da pasta da Saúde ausente, coube a Maria Antónia Almeida Santos em nome da maioria defender a política de saúde do Executivo. E interveio para recusar o epíteto de reforma «parcelar», dizendo preferir chamar-lhe «gradual». Afirmou-se também muito satisfeita por 152 mil utentes terem passado a dispor de médico de família.
O secretário de Estado da Saúde, Francisco Ramos, afinando pelo mesmo diapasão, depois de ter garantido que o Governo tem «a mesma política» e a «mesma prioridade política», considerou que a reforma dos cuidados primários de saúde é «prioritária» e será incrementada de forma «gradual, lenta e segura».
Na réplica, o presidente do Grupo comunista insistiu na ideia de que esta reforma é parcelar, assinalando, entre outras razões, o facto de em nenhum lado estar escrito que o objectivo é estender o sistema das USF a todo o País e a todos os portugueses. E lembrou, demonstrando como é parcelar, a circunstância de reduzir os cuidados primários de saúde a «uma multidisciplinaridade restrita, uma vez que só comporta clínicos gerais, enfermeiros e administrativos».
Privatização à vista
Pôs igualmente em evidência esse outro traço marcante da reforma que é o de ser «insuficiente», qualidade que lhe é conferida por não ter «os meios para resolver os graves problemas de falta de recursos humanos, de instalações desajustadas e decrépitas, da falta de equipamentos e outros meios».
Recordado, a este respeito, foi também o facto de os resultados da reforma estarem longe da propaganda inicial e dos objectivos anunciados pelo anterior ministro da Saúde que, em Agosto de 2006, chegou a afirmar que só nesse ano, com a entrada em vigor de 100 USF, mais de 160 mil pessoas teriam finalmente médico de família.
Outra questão central criticada na reforma – e por isso o líder comunista a apelidou de capciosa – prende-se com os propósitos nela não declarados. «Esconde a grave questão da privatização dos cuidados primários, que o Governo não inscreveu no decreto-lei, escondendo-a num despacho normativo», acusou Bernardino Soares, obtendo do secretário de Estado a resposta de que tudo não passa de um «preconceito ideológico» do PCP.
Ouvida no debate a posição sintonizada quer da maioria quer do Governo, o presidente da formação comunista viu confirmadas as razões de preocupação da sua bancada e não teve dúvidas em concluir que o Governo admite que «2008 seja o ano da entrada do capital privado nos cuidados primários de saúde».
Saúde como negócio
Na resposta às acusações de Bernardino Soares, a deputada Maria Antónia Almeida Santos (PS) evocou o facto de o diploma ter sido «alvo de negociação colectiva com os sindicatos», assegurando ainda que se baseia na «gestão participada e na auto-associação» dos profissionais. Disse registar, por outro lado, vendo nisso uma aparente contradição, o facto de o PCP estar de acordo com os princípios subjacentes ao diploma.
O líder parlamentar comunista refutou os argumentos lembrando-lhe que, sendo certo que o decreto-lei foi negociado com os sindicatos, não deixa de ser igualmente verdade que estes se queixam de que uma parte do acordado não está a ser pago. «Não basta negociar; é preciso depois cumprir o acordado com os sindicatos e não é isso que o Governo está a fazer», sustentou.
E sobre os princípios partilhados pelo PCP, Bernardino Soares não hesitou em reiterar a sua concordância com os mesmos. O problema não está aí mas sim na «prática do Governo e na possibilidade de privatização», explicou, fazendo notar que em relação a esta questão central a deputada do PS não disse rigorosamente nada.